Política

Decisão tomada: dosimetria foi aprovada e Bolsonaro vai ser s… Ler mais

A madrugada desta quarta-feira (10/12) marcou um dos debates mais intensos do ano na Câmara dos Deputados. Em uma votação que surpreendeu até mesmo parlamentares experientes, o Plenário aprovou o projeto de lei que altera o cálculo das penas aplicadas aos condenados pelos acontecimentos de 8 de janeiro — entre eles o ex-presidente Jair Bolsonaro. A proposta, conhecida como PL da Dosimetria, muda de forma significativa a maneira como duas tipificações são contabilizadas pela Justiça, reacendendo discussões jurídicas e políticas em Brasília. O tema, que já vinha mobilizando a opinião pública nos últimos meses, reacende agora um novo capítulo na disputa entre governo, oposição e Judiciário.

O ponto central do projeto aprovado estabelece que as penas pelos crimes de tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado democrático de Direito deixam de ser somadas, passando a valer apenas a punição de maior tempo, que é a associada à tentativa de golpe — de 4 a 12 anos. Isso significa que as condenações definidas pelo Supremo Tribunal Federal em setembro serão automaticamente reduzidas, caso o projeto avance no Senado e receba sanção presidencial. O novo modelo altera cálculos considerados até então determinantes para os réus e impacta diretamente o futuro jurídico e político dos envolvidos.

A sessão, que terminou com 291 votos favoráveis e 148 contrários, ocorreu sob clima tenso. A inclusão repentina do tema na pauta, anunciada na manhã de terça-feira (9/12) pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), pegou a base governista desprevenida. A movimentação levou deputados a tentarem adiar a votação, enquanto a oposição comemorava o avanço do projeto. Agora, a proposta segue para o Senado Federal e, caso aprovada, irá à sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que ainda pode vetar trechos ou o texto integral. Mesmo assim, eventuais vetos ainda poderiam ser derrubados pelo próprio Congresso.

Além de unificar penas, o PL traz mudanças relevantes para o cumprimento delas. O texto prevê que detentos possam progredir mais rapidamente do regime fechado para o semiaberto, reduzindo o tempo mínimo atualmente exigido de 1/4 para 1/6 da pena, desde que não tenham cometido crimes contra a vida. O projeto também amplia o peso de dias dedicados a trabalho ou estudo para abatimento de pena, inclusive para quem cumpre prisão domiciliar. Isso, segundo o relator deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), pode reduzir pela metade o período que alguns réus permaneceriam no regime fechado.

No caso de Jair Bolsonaro, a mudança representa um impacto profundo. O ex-presidente foi condenado em setembro a 27 anos e três meses de prisão. Com a nova regra, essa pena seria recalculada para 20 anos e 8 meses, já que o crime de abolição do Estado democrático de Direito seria incorporado ao de tentativa de golpe. Com a remissão por estudo e trabalho, o tempo em regime fechado poderia cair para cerca de 2 anos e 4 meses, segundo estimativa apresentada pelo próprio relator. O mesmo vale para outros nomes importantes condenados no mesmo julgamento, como Almir Garnier, Paulo Sérgio Nogueira, Walter Braga Netto, Augusto Heleno, Anderson Torres e Alexandre Ramagem, cujas penas variam de 16 a 24 anos.

Embora o projeto possa beneficiar Bolsonaro e figuras de destaque da antiga cúpula governamental, seu relator nega que a proposta tenha sido construída com objetivo direcionado. Paulinho da Força argumenta que o texto busca corrigir excessos e uniformizar critérios de punição. Ele citou a condenação de Débora Rodrigues dos Santos — conhecida como “menina do batom” — como exemplo de casos em que a revisão poderia atenuar penalidades consideradas desproporcionais. A jovem foi condenada por pichar uma estátua durante os acontecimentos de 8 de janeiro, episódio que se tornou símbolo nas redes sociais de críticas às decisões do STF.

O debate sobre anistia, que permeou o Congresso desde o fim das eleições de 2022, também ajuda a contextualizar o caminho que levou ao PL da Dosimetria. Inicialmente, o projeto do deputado Marcelo Crivella (Republicanos-RJ) propunha anistia ampla aos envolvidos no episódio. Porém, diante da forte reação negativa de parte do meio jurídico e da sociedade — confirmada por pesquisas que indicam maioria contrária à medida — a oposição mudou de estratégia e passou a defender ajustes nas penas. Assim nasceu o substitutivo de Paulinho da Força, visto por seus aliados como uma solução intermediária, capaz de atender parte das reivindicações sem gerar desgaste político ou institucional ainda maior.